login:     Senha:   

Histórico

O Jornal dos Comerciários entrevistou o PROF. DR. MANOEL RICARDO SIMÕES (conhecido como Breguelé), geógrafo especialista em Baixada Fluminense e autor de vários livros sobre a região, a respeito da crise hídrica, que tem como consequência a falta de água em algumas regiões. Veja a entrevista completa por áudio, ou transcrita abaixo:

 

- A crise hídrica tem a ver com mudanças climáticas?
Não. Por que na verdade o clima muda muito lentamente. O que existe são ciclos. Esses ciclos, por exemplo, podem ser anuais. No Rio de Janeiro, por exemplo, você tem chuva concentrada de outubro até março e um período seco como é setembro. Também tem uns períodos anuais. Tem anos que chove bastante tem anos que não chove quase nada. E até décadas inteiras. Por exemplo, na década de 30 choveu muito pouco. O que na verdade é de interferência humana é o fato de que, nessa região onde chove dessa maneira, você tem que ter sistema de guardar essa água no solo, que no caso, por exemplo, seria a floresta. As florestas naturalmente são grandes reservatórios de água, por que elas evitam que essa água caia no solo e vá rapidamente para o rio. Elas armazenam água no solo e essa água vai sendo lentamente sendo jogada pro rio. A interferência humana nesse caso é quando você retira essa cobertura florestal e coloca no seu lugar, por exemplo, pasto, ou pior ainda, área urbanizada.


- Então a crise hídrica é causada pela sociedade?
Sim. Por que na verdade é o modelo de ocupação do solo que determina essa falta de água no solo. Quando você desmata floresta e a substitui por pastos, e quando você impermeabiliza o solo com asfalto, com casa, você esta evitando que essa água infiltre e vá lentamente para o rio. O que diminui a vazão do rio, por exemplo, quando não tem chuva, e aumenta a vazão do rio quando tem chuva. É o que causa também as enchentes. Na verdade a enchente e a crise hídrica são ‘irmãs gêmeas’ vamos dizer assim. Por que se chover demais, (e você) não guardar essa agua, levar para o rio, vai encher a casa das pessoas. E se essa agua não infiltrar, quando faltar chuva, não vai ter lá. Outro fator importante é que com nosso processo de ocupação, com uma rede de esgoto ineficiente, você joga o esgoto diretamente na galeria pluvial que vai para os rios, e você contamina o rio. Esses rios, por exemplo, ao passarem por essas regiões, eles contaminam o lençol freático, o que inviabiliza, por exemplo, o uso de poços artesianos. E também, de certa maneira, uma das soluções com que se poderia evitar a crise hídrica é você consumir agua da chuva. Agua da chuva, por exemplo, você poderia armazenar em cisternas, poderia armazenar em piscinões públicos, reservatórios, para que essa água fosse usada, não para consumo humano, mas (para consumo) indireto, como, por exemplo, nos vasos sanitários, para lavar carro, pra lavar calçadas. Usos que eu digo ‘não humanos’. Não dá pra lavar, nem cozinhar, nem tomar banho com ela, mas dá pra ter esses usos. Então na verdade ao mesmo tempo em que você evita que a agua chegue ao lençol freático e abasteça o rio durante o ano, na medida em que você contamina essa agua do solo, e você joga fora no rio essa agua da chuva eu posso dizer que a crise hídrica é de origem humana. E o terceiro fator é que você tem populações muito grandes em áreas que você realmente não teria nem naturalmente como abastecê-las. Então você tem que captar essa agua em algum lugar, você tem que tratar, e tem que transportar, e isso custa dinheiro, e custa uma infraestrutura que você tem que fazer um planejamento. Aí que é a origem da crise hídrica para a maioria das pessoas, por que há populações que vivem a crise hídrica permanentemente. Ela só vira noticia quando essa falta de agua atinge os setores mais abastados da sociedade


- Quem paga a conta pela falta d’água?
Bom, claro, sempre, aqueles que, politicamente falando, são mais frágeis. Ou seja, a população mais pobre. Por que isso acontece? Por que quando você tem, por exemplo, uma falta de chuva, ou algum problema, uma ineficiência do sistema de captação e tratamento de agua, você tem menos agua pra distribuir. (...) Quase todo o sistema de distribuição de agua através de adutoras, subadutoras, e o encanamento, eles tem sistemas de controle. Você pode escolher quem vai receber e quem não vai receber agua. Então a partir do momento que você tem falta de agua generalizada, você tem, por exemplo, manobras para que essa agua chegue, por exemplo, nos centros das cidades, geralmente habitado por populações mais ricas. E é claro, se a agua vai para a população mais rica, obviamente, a população de renda mais baixa acaba ficando sem agua por que você simplesmente desvia, faz desvios, através de registros, estão cheios deles pela cidade, as chamadas manobras. Com essas manobras você joga agua em determinada rede e você seca outra. Então assim obviamente você vai optar politicamente pelos grupos mais fortes politicamente. Então quem acaba pagando a conta pela crise hídrica é finalmente a população mais pobre, e isso não tem nada a ver com aquecimento global, mudanças climáticas, na medida em que você tem certa previsibilidade da escassez e da falta de chuva durante o ano, durante um conjunto de 5, 6 anos ou até de décadas. Na verdade o que falta é você fazer um sistema de planejamento que permita guardar agua, tratar essa agua e distribuir para toda a população, e não somente para um pequeno grupo.

 

COMERCIÁRIO: Consulte seu
Agendamento de Homologação


Clique aqui para se filiar


 

STCNI - Sindicato dos Trabalhadores do Comércio de Nova Iguaçú e Regiões
By: Fernanda Gonçalves